Evolução do Esforço Financeiro por parte do Estado com as Empresas Públicas (2009-2022)

Das discussões económicas contemporâneas faz parte o debate permanente sobre a presença e função de empresas públicas nas economias de mercado. Enquanto alguns argumentam que a existência de empresas públicas é essencial para a promoção do desenvolvimento económico e social ao prestar serviços públicos essenciais, outros criticam a sua eficiência, transparência e possíveis distorções no mercado.
No panorama português, as empresas públicas têm desempenhado nas últimas décadas um papel importante na economia, muitas vezes como pilares de serviços essenciais como são os transportes e saúde e, especialmente durante períodos mais conturbados, e.g. a pandemia da Covid-19. No entanto, a persistência de prejuízos e ineficiências em alguns dos serviços prestados por estas empresas tem suscitado fortes críticas sobre a sua eficiência e transparência. Adicionalmente, tem-se observado uma supervisão ineficaz por parte do Estado, o que compromete a efetividade do ciclo de responsabilização da gestão pública, levantando ainda mais questões sobre uma gestão pouco transparente.
Tendo por base o que antecede, pretende-se neste texto analisar a evolução do esforço financeiro por parte do Estado com as empresas públicas entre 2009 e 2022, nomeadamente as principais componentes de despesa e fontes de receitas, com o objetivo de identificar as principais formas de alocação dos recursos públicos.
Esforço financeiro do Estado
O esforço financeiro do Estado atingiu os 3,2 mil M€ em 2022, o que representa um aumento de 108% face a 2009, ano em que o montante ascendeu a 1,5 mil M€ (ver Gráfico 1). Os fluxos financeiros entre o Estado e o conjunto de empresas públicas atingiram máximos no período entre 2011 e 2014 decorrentes, em grande parte, da situação económica do país (marcada pela crise financeira). Desde 2017 tem-se vindo, por outro lado, a registar uma tendência decrescente nesses fluxos financeiros. Em percentagem do PIB, o esforço financeiro representou 1,3% em 2022, um aumento de 0.4 p.p. relativamente a 2009.
Gráfico 1. Esforço financeiro do Estado em milhares de euros e em % do PIB
Fonte: Conta Geral do Estado de 2009 a 2022. INE para o PIB.
Os fluxos financeiros resultantes da função (acionista) do Estado nas empresas podem assumir a forma de despesa, incluindo, entre outras, dotações de capital, indemnizações compensatórias e a concessão de empréstimos, mas também, em sentido contrário, a forma de receita, destacando-se essencialmente os dividendos.
Estes últimos, que constituem a única componente das receitas do Estado neste âmbito, registaram no período considerado um montante pouco expressivo (ver Gráfico 2), apesar de um ligeiro aumento nos últimos anos, principalmente devido às entregas por parte de empresas financeiras públicas, como a Caixa Geral de Depósitos. Em termos de peso no PIB, os dividendos de empresas públicas representavam apenas 0,3% em 2022, o mesmo peso registado em 2009. Apesar de algumas empresas optarem pela não distribuição de resultados, o reduzido montante de dividendos também reflete a baixa rentabilidade destas empresas, uma tendência persistente nos últimos anos.
Diversamente, a despesa do Estado neste âmbito ascendeu a 3,8 mil M€ em 2022, o que representa um aumento de 81% em relação a 2009 (2,1 mil M€). A partir de 2017, observa-se uma tendência de redução, o que explica a tendência de queda do esforço financeiro, mencionada anteriormente. Em 2022, esta despesa representava 1,6% do PIB, um aumento de 0.4 p.p. em relação a 2009.
Gráfico 2. Evolução das receitas e despesas do Estado no âmbito dos fluxos financeiros com o universo de empresas públicas (milhares €)
Fonte: Conta Geral do Estado de 2009 a 2022.
As dotações de capital e os empréstimos concedidos pelo Tesouro têm sido as principais componentes da despesa do Estado com as empresas públicas ao longo dos últimos anos (ver Gráfico 3). No entanto, ao analisar o peso destas duas componentes verifica-se que as dotações de capital têm ganhado preponderância em detrimento dos empréstimos concedidos pelo Estado a empresas públicas. Em 2022, as dotações de capital representaram 74,9% do total das despesas do Estado com as empresas públicas, enquanto os empréstimos representaram apenas 13,5%.
As dotações de capital destinam-se, essencialmente, a realizações de capital social e o Estado tem reforçado o capital de várias empresas nos últimos anos com o objetivo de cobrir prejuízos. Um caso concreto são as entidades públicas empresariais integradas no Sistema Nacional de Saúde, que têm recebido reforços de capital recorrentes para regularizar dívidas a fornecedores. No entanto, este facto pode induzir alguma desresponsabilização dos gestores das empresas públicas, o que poderia ser mitigado com a opção de concessão de empréstimos, nos quais a empresa fica obrigada a amortizar e suportar os encargos inerentes.
Por fim, as indemnizações compensatórias, destinadas a reequilibrar as empresas que prestam obrigações de serviço público, têm ganhado algum peso desde 2018, revertendo a tendência de decréscimo observada desde 2010. Destacam-se como principais destinatárias as empresas de transporte de passageiros e de infraestrutura.
Gráfico 3. Evolução das componentes da despesa do Estado com empresas públicas (% do fluxo total de despesas com empresas públicas)
Fonte: Conta Geral do Estado de 2009 a 2022.
Considerações finais
Embora existam sinais de que o esforço financeiro do Estado português com as empresas públicas tenha melhorado nos últimos anos, é importante reconhecer que estas ainda constituem um encargo significativo nas contas públicas. A maioria das empresas públicas atuam num contexto específico e é condicionada por fatores que afetam a sua rentabilidade, como a obrigação de prestação de serviços com baixo valor, os quais podem não estar a ser devidamente compensados pelo Estado. Não obstante, a estas possíveis condicionantes, torna-se evidente que é também fundamental promover uma reforma na gestão dessas empresas, visando a melhoria da sua eficiência e garantindo uma maior responsabilização pelos resultados obtidos. Dessa forma, será possível controlar o impacto destas empresas nas finanças públicas e promover uma gestão eficaz que contribua para o desenvolvimento económico e social do país.
Data da última atualização: 20/03/2024