O Conselho das Finanças Públicas (CFP) divulga a Análise da Proposta de Orçamento do Estado para 2020 (POE/2020).
A POE/2020 configura aquilo que se poderia designar por um orçamento de continuidade, já que prossegue a estratégia de consolidação orçamental dos últimos anos perspetivando um excedente orçamental de 0,2% do PIB em 2020 e uma redução do rácio da dívida pública em 2,7 p.p. do PIB, cumprindo a regra de redução da dívida. Esta redução não poderá deixar de ser considerada como uma boa notícia. Para além do cumprimento das regras nacionais e europeias, a diminuição do peso da dívida permite a libertação de recursos públicos para outros fins que não o pagamento de juros e é condição para a libertação de espaço orçamental que se pode tornar importante em tempos mais adversos. Acresce que a própria dinâmica de redução tem permitido a maior facilidade e o menor custo no financiamento público, num processo virtuoso que se autoalimenta.
O saldo estrutural programado (recalculado) corresponderá a um défice 0,1% do PIB, um valor próximo do objetivo de médio prazo de alcançar um saldo estruturalmente equilibrado. Já a evolução programada da despesa não cumpre o valor de referência aplicável, apresentando a despesa primária líquida de medidas discricionárias do lado da receita e de medidas temporárias e não recorrentes um desvio de 0,9% do PIB em 2020. Este desvio conjugado com evolução programada para o saldo estrutural aponta para um risco de desvio face ao cumprimento das regras comunitárias tal como refletidas na mais recente Recomendação do Conselho da União Europeia.
A estratégia de continuidade é igualmente evidente na pouca expressão financeira das novas medidas de política previstas para 2020, afetando negativamente o saldo em cerca 109 M€. O maior impacto de medidas de política em 2020 decorrerá dos efeitos defasados (carry over) das medidas anteriormente tomadas, com um impacto (direto) negativo no saldo de 553 M€ (800 M€ do lado da despesa e receitas acrescidas em 246 M€).
Prevalecem, além disso, riscos que cumpre assinalar. Além das pressões resultantes da despesa corrente do Estado, o excedente orçamental previsto de cerca de 0,2 por cento do PIB depende, pelo lado da receita, da concretização do crescimento económico projetado no cenário, cujos riscos associados são descendentes e sobretudo de natureza externa. No mesmo sentido descendente, concorre a necessidade de apoios ao sector financeiro, com a possibilidade de os mesmos excederem os montantes já previstos na proposta orçamental.
É verdade que o crescimento económico recente, e que se perspetiva para o futuro próximo, tem permitido a progressiva eliminação do défice orçamental e a redução do rácio da dívida pública. No entanto, este crescimento tem resultado mais da absorção de níveis de desemprego que no passado recente se colocaram em patamares anormalmente elevados, do que em aumentos da produtividade dos fatores produtivos que demonstrem um inequívoco progresso económico.
O maior crescimento e a acrescida produtividade dependem de um ambiente mais favorável ao investimento, num contexto de crescente competitividade internacional. Tal implicará progressos na fiscalidade, na educação e na formação profissional, na seletividade do investimento público, na eficiência do sistema judicial e, em geral, na qualidade da despesa e da administração pública. A definição de políticas públicas estruturais, direcionadas para o crescimento, em muito beneficiaria da contextualização do orçamento em termos plurianuais e estratégicos.
O Conselho das Finanças Públicas volta a enfatizar a importância da perspetiva plurianual no que às contas públicas diz respeito, e, portanto, da implementação da Lei de Enquadramento Orçamental de 2015, de momento adiada para abril de 2020.
Data da última atualização: 21/01/2020