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Três anos após a eclosão da pandemia, as Administrações Públicas (AP) eliminaram o desequilíbrio orçamental, regressando em 2023 a uma posição de excedente de dimensão superior ao alcançado em 2019. A estimativa preliminar para o saldo orçamental apurado pelas autoridades estatísticas nacionais fixou-se em 1,2% do PIB. Trata-se de um superavit, que contrasta com o défice de 0,9% do PIB previsto na POE/2023. Este desempenho mais favorável colocou Portugal no grupo dos três Estados Membros da União Europeia que registou a maior recuperação do saldo orçamental desde 2021, elevando-o acima do nível pré-pandemia. 

 

Esta evolução positiva continuou a beneficiar dos ganhos na receita fiscal resultantes principalmente do aumento das remunerações com reflexo na receita de IRS, bem como da reação do IVA à subida dos preços dos bens e serviços. A supressão progressiva das medidas de resposta à pandemia e ao contexto de subida da inflação atenuou o crescimento nominal da despesa pública que refletiu já integralmente o efeito desfasado da subida de preços. O resultado conjugado destes efeitos contribuiu para a melhoria do saldo orçamental de 1,5 p.p. do PIB face ao ano anterior devido ao subsector da administração central e, em menor grau, aos Fundos da Segurança Social que viram reforçado o seu excedente orçamental. O saldo primário, o saldo que exclui os encargos com juros, mais do que duplicou o excedente face ao alcançado em 2022, atingindo 3,4% do PIB.

 

O excedente orçamental alcançado em 2023 seria de 1,7% do PIB, se não fosse afetado pelo impacto desfavorável de operações one-off, num valor equivalente a 0,5% do PIB. Excluindo o efeito daquelas operações, a melhoria do saldo face a 2022 foi de 1,9 p.p. do PIB resultante sobretudo das medidas discricionárias de política orçamental do governo, avaliada pela variação do saldo primário estrutural, que evidenciou um acréscimo de 2,0 p.p. do PIB potencial. Este forte contributo reflete a progressiva eliminação dos estímulos orçamentais utilizados na resposta à pandemia e aos efeitos provocados pela subida da inflação e pelo choque geopolítico. Neste contexto, a política orçamental adquiriu uma postura restritiva, não obstante o estímulo direto conferido pelo impulso orçamental associado ao Plano de Recuperação e Resiliência equivalente, em 2023, a 0,3 p.p. do PIB.

 

Refletindo estes desenvolvimentos, o desempenho orçamental em 2023 consolidou uma margem confortável face ao cumprimento da regra do saldo orçamental e da regra de redução do rácio da dívida nesse ano suspensas. Estes resultados contribuíram para alcançar pela primeira vez uma posição acima do equilíbrio orçamental estrutural, o que assegura o cumprimento do objetivo de médio prazo, um ponto de partida mais favorável para enfrentar um novo quadro de disciplina orçamental.

 

Em termos absolutos, em 2023, a receita foi determinante para a melhoria do saldo orçamental, cujo desempenho ficou acima do previsto nos documentos de programação orçamental. Os impostos diretos e indiretos foram responsáveis por mais de metade do aumento da receita pública, justificando as contribuições sociais quase um terço daquela variação. O crescimento do PIB nominal acima do previsto na POE/2023 contribuiu para este resultado. Com efeito, os cálculos do CFP (Caixa 8) permitem concluir que a tributação incidente sobre o PIB adicional não previsto pelo MF ascendeu a 45,5% em 2022 e a 43,2% em 2023. Apesar do forte crescimento percentual da receita pública (9%), o seu rácio no PIB registou uma redução para 43,5% do PIB (-0,2 p.p.), em resultado de uma maior variação do produto nominal (9,6%) face ao da receita. A carga fiscal, após três anos consecutivos de agravamento, registou uma redução de 0,2 p.p. do PIB para 35,6% do PIB.       

 

A despesa pública diminuiu o seu peso em percentagem do PIB em 1,8 p.p. em 2023, para 42,3% do PIB. Esta redução beneficiou do efeito do denominador, uma vez que o ritmo de crescimento do PIB nominal (9,6%) foi quase o dobro do da despesa pública (5,2%). Não obstante o menor impacto de medidas de mitigação do choque geopolítico e da inflação e a dissipação das medidas COVID-19, a despesa pública registou um aumento de 5554 M€ face a 2022, ainda que a sua execução tenha ficado abaixo do previsto na POE/2023. A despesa corrente primária foi determinante para esse aumento, para o qual contribuíram todas as suas componentes, exceto os subsídios e a “outra despesa corrente”. A execução da despesa corrente primária excedeu o previsto na POE/2023, sobretudo devido a medidas de política que foram posteriormente introduzidas no âmbito do Programa de Estabilidade, com incidência na despesa com prestações sociais, com pessoal e com subsídios. Os encargos com juros superaram o previsto na POE/2023 e cresceram quer em termos absolutos quer em percentagem do PIB, interrompendo a tendência descendente registada desde 2015. As despesas de capital aumentaram face ao ano anterior, sobretudo devido à FBCF financiada por fundos comunitários que não o PRR. Esta rubrica registou, no entanto, uma execução inferior em 1875 M€ ao previsto na POE/2023, devido essencialmente ao baixo grau de execução dos investimentos ao abrigo desse mesmo Plano.

 

A execução do PRR no primeiro triénio (2021-23) de implementação aponta para um valor global de 2410 M€. Dois terços deste resultado (1618 M€, ou seja 0,6% do PIB) deve-se à execução do ano de 2023, que apesar de registar uma aceleração na aplicação das verbas, continuou a ficar aquém do previsto pelo Governo nos documentos de programação orçamental. A taxa de execução face ao previsto na POE/2023 fixou-se em 61,8%, o que representa um desvio de 2282 M€. Esta execução mostrou-se, uma vez mais insuficiente para impulsionar o investimento público, que desde 2012 demonstra incapacidade para repor o stock de capital público, resultando num investimento líquido negativo, o que prejudica o potencial de crescimento económico no futuro.

 

O rácio da dívida pública prosseguiu a trajetória descendente fixando-se em 99,1% do PIB no ano de 2023, o valor mais baixo desde 2010. Este resultado, foi inferior ao previsto na POE/2023 (110,8% do PIB), traduziu uma redução anual daquele rácio em 13,3 p.p. do PIB. O efeito dinâmico (-7,6 p.p. do PIB), influenciado sobretudo pelo efeito dos preços devido à inflação, explicou mais de metade da redução do rácio da dívida, acompanhado em menor escala pelo efeito favorável do saldo primário (-3,4 p.p.) e pelo ajustamento défice-dívida (-2,3 p.p.). No âmbito do financiamento, apenas as Famílias reforçaram a sua posição em termos nominais, representando 17% do total do stock da dívida pública portuguesa. Esta evolução ficou a dever-se ao maior volume de subscrições líquidas de Certificados de Aforro, motivando o aumento da dívida detida pelo sector residente, de 55% para 58% do total da dívida pública. O Banco Central, que se inclui neste sector residente, continuava a ser o credor com maior representatividade (26,1% do total).

 

Ainda que não constituam dívida, um elevado nível de passivos contingentes pode, no entanto, indicar um elevado nível de risco orçamental. A forma mais comum de responsabilidades contingentes respeita a garantias concedidas pelo sector das AP. Os dados mais recentes sobre estas responsabilidades indicavam que, em termos consolidados, correspondiam a 4,5% do PIB em 2022. A maior parte destas garantias é emitida pelo Estado e por outras entidades da Administração Central. No final de 2023, as garantias ativas concedidas pelo Estado ascendiam a 10 969 M€, menos 371 M€ do que em 2022, o equivalente a 4,1% do PIB. Mais de três quartos destas garantias foi prestada a entidades das próprias AP (3,1 % do PIB), sendo o restante relativo a garantias prestadas a entidades públicas e outras entidades fora do perímetro orçamental. As responsabilidades das AP associadas a garantias concedidas para cobertura de linhas de crédito criadas no contexto da COVID-19 registaram uma diminuição anual de 2036 M€ para um valor de garantias vivas de 3478 M€ no final de 2023. Esta evolução refletiu um montante de amortizações muito superior ao de novas contratações, em consequência do encerramento progressivo dessas linhas de crédito.

Data da última atualização: 15/05/2024

Evolução Orçamental . Relatório nº 05/2024 . 15 maio 2024