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Evolução Orçamental das Administrações Públicas em 2022

Saldos, ajustamento e postura da política orçamental em 2022

No contexto em que a atividade económica superou os níveis pré-pandemia, as Administrações Públicas (AP) prosseguiram em 2022 a correção do seu desequilíbrio orçamental. Com efeito, nos últimos dois anos o saldo orçamental registou uma melhoria acumulada de 5,4 p.p. do PIB, aproximando-se de uma posição de equilíbrio semelhante à de 2019. 

 

Em 2022, o défice orçamental reduziu-se em 2,5 p.p. do PIB atingindo 0,4% do PIB, ampliando a margem de segurança face ao limite de 3% do PIB constante do Tratado de Funcionamento da União Europeia. O saldo orçamental foi melhor do que o previsto pelo Governo nos documentos de programação orçamental (défice de 1,9% do PIB). Este resultado beneficiou de importantes ganhos na receita fiscal resultantes da reação automática do IVA à subida dos preços dos bens e serviços acompanhada pela não atualização dos escalões de IRS em linha com a inflação. Uma estimativa própria do CFP aponta para que a não atualização dos escalões de IRS em linha com a inflação tenha beneficiado a receita deste imposto em 0,2% do PIB. No lado da despesa, a atualização salarial aplicada à função pública (0,9%), muito abaixo da inflação, favoreceu uma reação parcial e contida da despesa pública, cujas principais componentes, por não estarem sujeitas a uma indexação automática, viram o seu peso reduzir-se no PIB. Paralelamente, a descontinuação de uma grande parte do efeito das medidas de resposta à crise pandémica ajudou a compensar globalmente o custo orçamental das novas medidas destinadas a mitigar os efeitos do choque geopolítico e do impacto económico e social provocado pelo aumento dos preços. Em contraste, os apoios financeiros a empresas em contexto de reestruturação penalizaram o saldo em 0,6% do PIB, agravado pelo impacto, ainda que de menor dimensão, de uma medida one-off (0,1% do PIB). O saldo primário, que exclui os juros, regressou a uma posição excedentária atingindo 1,6% do PIB.

No segundo ano de implementação do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), a execução de 2022 aproximou-se dos 800 M€ (0,3% do PIB), menos de um quarto do previsto no OE/2022. O investimento público financiado pelo PRR ascendeu a 290 M€ dos 1216 M€ previstos no OE/2022 (grau de execução de 24%). Esta execução mostrou¬ se insuficiente para impulsionar o investimento público para fazer face à depreciação do stock de capital das AP, em erosão há mais de uma década.

 

Removendo o impacto das medidas one-off, que não conduzem a uma alteração sustentada da posição orçamental, a diminuição do défice (3,0 p.p. do PIB) continuou a ser suportada pela evolução económica favorável (2,4 p.p. do PIB) e pela redução dos encargos com juros (0,4 p.p. do PIB). A restante parte, que é teoricamente atribuída à ação governativa, tal como avaliada pela variação do saldo primário estrutural, contribuiu em 0,1 p.p. do PIB para a melhoria da situação orçamental. Se a este efeito aparentemente restritivo se acrescentar o impulso orçamental expansionista de 0,3 p.p. do PIB conferido pelo PRR sobre a atividade económica em 2022 pode concluir-se que a execução orçamental das administrações públicas se traduziu num impulso para a atividade económica de 0,2 p.p. do PIB. Este resultado traduz uma postura expansionista da política orçamental incluindo PRR.

 

Em consonância com estes desenvolvimentos, corrigindo o efeito do ciclo económico, estima-se que a convergência para o objetivo de médio prazo tenha prosseguido em 2022. Nesse ano, o saldo estrutural ter-se-á situado em -1,1% do PIB, uma melhoria de 0,5 p.p. do PIB face ao ano anterior, explicada sobretudo pelo decréscimo dos encargos com juros.

 

Receita e despesa em 2022

A receita pública cresceu 10,2% em 2022, ligeiramente abaixo do verificado para o PIB nominal (11,4%), implicando que o rácio daquele agregado no PIB se situasse em 44,4%, inferior em 0,5 p.p. ao observado no ano anterior. Em termos absolutos, a receita das AP aumentou 9818 M€ impulsionada, exclusivamente, pela receita fiscal e contributiva. A tributação direta, cujo aumento atingiu 24,1%, foi responsável por mais de metade do crescimento da receita fiscal das AP, destacando-se a forte recuperação da receita de IRC após dois anos de quedas consecutivas devido ao contexto pandémico. Os impostos indiretos registaram um crescimento de 11,8%, refletindo o desempenho robusto do consumo privado nominal (12,5%). As contribuições sociais efetivas cresceram 10,3%, continuando a refletir a dinâmica positiva do mercado de trabalho. O crescimento da receita dos impostos, em especial dos impostos diretos a um ritmo superior ao do PIB nominal, elevou a carga fiscal para 36,2% do PIB, um novo máximo histórico. A este respeito, assinale-se ainda o aumento do peso do IRS e do IRC nas respetivas bases de incidência. Também o peso da receita de IVA sobre o consumo privado nominal aumentou no ano em análise. Em contraste, a receita não fiscal e não contributiva registou uma redução de 8,4% em 2022, penalizada pela evolução da “outra receita corrente” e da receita de capital. Este comportamento refletiu o decréscimo acentuado das verbas provenientes da União Europeia ao abrigo do financiamento das medidas de combate à pandemia de COVID-19 e o efeito base decorrente do reembolso da prepaid margin relacionada com os empréstimos recebidos no contexto do Programa de Assistência Financeira. Ajustada dessa operação one-off, a receita de capital aumentaria o seu peso no PIB em 0,1 p.p..

 

No que respeita à despesa pública, o seu peso em percentagem do PIB diminuiu 3 p.p. em 2022, tendo passado para 44,8% do PIB. Esta redução beneficiou do efeito do denominador, pois o crescimento do PIB nominal (11,4%) foi muito superior ao da despesa pública, ainda que esta tenha acelerado de 3,8% em 2021 para 4,4% em 2022. Em termos absolutos, o aumento face a 2021 foi de 4,5 mil M€, não obstante a diminuição do impacto de medidas COVID-19 ter mais do que compensado a despesa decorrente da adoção de medidas de mitigação do choque geopolítico e da inflação. A despesa corrente primária registou um aumento de 3,8 mil M€, para o qual contribuíram praticamente todas as suas componentes (exceto os subsídios, que beneficiaram de uma forte redução do impacto de medidas COVID-19). As despesas de capital aumentaram 1,2 mil M€, dos quais 0,8 mil M€ na rubrica “outras despesas de capital” e 0,4 mil M€ na FBCF. O crescimento da FBCF foi impulsionado pela despesa financiada pelo PRR, mas abrandou face ao registado em 2021, reduzindo o seu peso no PIB em 0,1 p.p.. Os encargos com juros diminuíram em valor absoluto e em percentagem do PIB pelo oitavo ano consecutivo.

 

Subsectores em 2022

Os desenvolvimentos favoráveis em todos os subsectores das AP contribuíram para a redução do défice orçamental. A Administração Central foi responsável por quase dois terços da melhoria do saldo orçamental ao reduzir o seu défice em 2,9 mil M€ (1,6 p.p. do PIB) para 5175 M€ (2,2 % do PIB). Nos Fundos de Segurança Social, o excedente atingiu 4,3 mil M€ (1,8% do PIB), um novo máximo na série disponível desde o ano 2000, beneficiando em 0,6 p.p. do PIB a variação do saldo orçamental das AP. A Administração Regional e Local contribuiu em 0,3 p.p. do PIB para a evolução positiva deste indicador, reduzindo o seu desequilíbrio orçamental para uma posição próxima do equilíbrio.

 

Dívida pública em 2022

Em 2022, o rácio da dívida pública prosseguiu numa trajetória descendente, alcançando um nível inferior ao registado em 2019. A diminuição de 11,5 p.p. do PIB deveu-se aos contributos favoráveis do efeito dinâmico (-10,9 p.p.), particularmente influenciado pelo contributo do efeito preço devido à elevada inflação registada neste ano, e do efeito saldo primário (-1,6 p.p.). O ajustamento défice-dívida registou um contributo desfavorável (1 p.p.), apesar da diminuição de numerário e depósitos. A dívida líquida de depósitos das AP acompanhou a evolução do rácio da dívida pública, diminuindo 10 p.p. do PIB, para 108,1% do PIB.

 

No âmbito do financiamento, destaca-se a posição suportada pelo Banco Central, essencialmente através do Public Sector Purchase Programme e do Pandemic Emergency Purchase Programme, representando 26,2% do stock de dívida pública portuguesa. A restante dívida detida pelo sector residente situou-se em 29,1% do total em 2022, enquanto o sector não residente diminuiu ligeiramente a sua posição face a 2021 (44,7% do total da dívida, face a 45,2% do total no ano anterior).

 

Comparação com os documentos de programação orçamental

O crescimento nominal da receita pública (10,2%) foi quase o dobro do antecipado no OE/2022 (5,4%). Este desvio ascendeu a 4664 M€, ficando a dever-se, exclusivamente, à evolução favorável da receita fiscal e contributiva (+6767 M€). Em comparação com a estimativa do MF para 2022 implícita à POE/2023 (de outubro de 2022), registou-se também um desvio positivo, embora de menor dimensão (1330 M€), resultando integralmente do desempenho da receita proveniente de impostos e de contribuições sociais (+2057 M€). A despesa pública ficou 1196 M€ acima do previsto no OE/2022. Para esse desvio contribuiu a despesa corrente primária (3152 M€), em grande parte devido ao impacto orçamental de medidas excecionais de apoio às empresas e às famílias para mitigação dos efeitos da inflação, que não estavam previstas no OE/2022. Esse impacto ocorreu sobretudo nas prestações sociais e subsídios, rubricas em que a despesa foi superior ao previsto em 1690 M€ e 561 M€, respetivamente. Em sentido oposto, a despesa de capital e os encargos com juros fixaram-se abaixo do previsto no OE/2022 em 1643 M€ e 313 M€, respetivamente. No âmbito da despesa de capital, salienta-se o facto de a FBCF ter ficado 1416 M€ aquém da previsão inicial do MF, praticamente o dobro do desvio de 722 M€ registado no ano de 2021. Já em comparação com a estimativa do MF para 2022 implícita na POE/2023, a despesa pública foi inferior em 2155 M€, dos quais 1572 M€ na despesa de capital, 373 M€ nos encargos com juros e 210 M€ na despesa corrente primária.

Data da última atualização: 11/05/2023

Evolução Orçamental . Relatório nº 5/2023 . 11 maio 2023