A resposta às alterações climáticas implicará transformações profundas nos sistemas sociais e económicos, envolvendo investimentos significativos, tanto por parte dos orçamentos públicos como do sector privado. Esta publicação ocasional, da autoria de Erica Marujo, Nuno Gonçalves e Rui Dias, pretende enquadrar a problemática das alterações climáticas na economia portuguesa e compreender os seus efeitos nas finanças públicas.
Numa análise da situação atual relativamente à evolução das emissões nacionais de gases de efeito de estufa (GEE) e a outros indicadores de vulnerabilidade e de exposição a alterações climáticas, Portugal encontra-se numa posição relativamente vulnerável em termos de exposição aos riscos físicos quando comparado com outros países europeus, particularmente em termos da exposição ao risco de escassez de recursos de água, fogos florestais e vagas de calor. Em termos de medidas de mitigação e de adaptação, Portugal tem em curso a implementação de diversas medidas no sentido de atingir a neutralidade carbónica até 2050. Apesar da aprovação de vários planos de ação climática, é evidente a necessidade de melhor articulação entre os vários instrumentos e de desenvolver a sua dimensão financeira de forma a garantir uma maior transparência dos processos inerentes e assegurar a concretização das metas acordadas.
Os efeitos macroeconómicos das alterações climáticas são de difícil modelação, estando assim envoltos em elevada incerteza. Os diversos cenários de evolução macroeconómica constituem uma ferramenta fundamental quer no apoio à formulação da política climática do país, quer na mitigação do impacto económico da escolha de políticas. Os estudos consultados pelos autores desta publicação ocasional concluem, em geral, que cumprir o Acordo de Paris sem adotar medidas de mitigação e adaptação adequadas não é suficiente para limitar os efeitos macroeconómicos adversos das mudanças climáticas num horizonte relativamente curto. Para Portugal, cumprir o objetivo do Acordo de Paris não impede um impacto negativo de 0,2% no PIB per capita ou de 0,4% no PIB até 2050, face a um cenário sem alterações climáticas. Num cenário mais severo de aumento de 3,2º C das temperaturas globais até 2050, o impacto estimado situa-se entre -1,2% no PIB e -2,5% no PIB per capita, face a um cenário sem alterações climáticas. O papel preponderante da dimensão climática na formulação das políticas económicas e orçamentais no curto, médio e longo prazo torna impreterível a inclusão da dimensão climática nas projeções macro-orçamentais nos documentos de programação orçamental.
O Roteiro Nacional para a Neutralidade Carbónica 2050 estima o investimento adicional necessário para a neutralidade carbónica em Portugal, no período de 2016 a 2050, em cerca de 1,2% do PIB/ano. Não se conhecem, no entanto, estimativas globais quanto aos custos associados a medidas de adaptação, sem prejuízo de estes serem identificados como elevados em diversos documentos. Estas estimativas comparam com despesas nacionais em proteção ambiental correspondentes a 1,4% do PIB em 2018, dos quais cerca 12,6% atribuídas às administrações públicas. Ainda que o seu peso tenha aumentado nos últimos anos, estas representavam apenas 1,4% da despesa pública em 2019 (subindo para 5,9%, cerca de 2,5% do PIB, se se considerar também despesas públicas com transportes, combustíveis e energia e abastecimento de água). Do lado da receita, os impostos com relevância ambiental ascenderam a 2,6% do PIB em 2020 (2,7% em 2019), três quartos dos quais relativos a impostos sobre a energia, que incluem o imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos bem como as licenças de emissão de GEE.
Os fundos europeus, com (quadro financeiro plurianual) ou sem comparticipação nacional (Plano de Recuperação e Resiliência), adquirem uma importância fundamental no financiamento das respostas às alterações climáticas. Para Portugal, estima-se que existam cerca de 9 mil M€ de fundos europeus disponíveis entre 2021 e 2030, a que acrescem, até 2023, parte das verbas não executadas ao abrigo do quadro financeiro plurianual anterior (PT2020), num total de quase 11,3 mil M€. O volume financeiro associado coloca questões quanto à capacidade de execução, seja pela comparação com o nível atual das despesas direta ou indiretamente relacionadas com o ambiente seja com a execução neste domínio no PT2020. Apresentam-se, no entanto, como essenciais face às necessidades de investimento estimadas. Apesar de não lhe caber qualquer referência na recentemente aprovada Lei de Bases do Clima, toma especial relevância como instrumento financeiro nacional para a transição climática o Fundo Ambiental, criado em 2016. A este fundo encontram-se consignadas, nomeadamente, as receitas dos leilões de licenças de emissão de GEE, bem como o adicional de carbono ao imposto sobre os produtos petrolíferos, a que acrescem competências quanto à operacionalização de fundos europeus.
Data da última atualização: 26/05/2022