Perspetivas macroeconómicas
Este exercício de projeção é realizado num momento em que se assiste a um abrandamento generalizado no crescimento dos principais parceiros comerciais de Portugal, o que ainda não se encontra totalmente refletido nas hipóteses referentes à procura externa deste exercício devido às previsões das organizações internacionais utilizadas como fonte datarem de junho/julho. Com efeito, a transmissão das decisões restritivas de política monetária na Europa e nos EUA está sujeita a um desfasamento temporal variável consoante as caraterísticas das economias, sendo neste domínio significativas as diferenças no regime fixo ou variável das taxas de juro dos créditos à habitação e no refinanciamento das empresas. Acresce que o impacto económico da guerra em curso na Ucrânia se faz sentir de forma mais intensa na Europa do que nos EUA, incluindo ao nível de uma maior exposição à volatilidade ainda prevalecente no mercado de energia. Assim, no curto prazo, designadamente para 2024, assinala-se o risco de o enquadramento externo poder ser pior do que o assumido. Em sentido oposto, uma aceleração na execução do PRR e dos PT2020 e PT2030 mais forte do que a assumida nas hipóteses do exercício poderá ter um impacto positivo sobre a FBCF.
Assim, com base na informação disponível, o CFP projeta um crescimento do produto interno bruto (PIB) em volume de 2,2% para 2023 e um abrandamento para 1,6% em 2024, seguido de uma recuperação gradual para 2,0% até ao final do horizonte temporal da projeção.
Síntese do cenário macroeconómico do CFP (variação, %)
2022 | 2023 | 2024 | 2025 | 2026 | 2027 | |
Produto Interno Bruto | 6,7 | 2,2 | 1,6 | 1,8 | 1,9 | 2,0 |
Consumo privado | 5,8 | 1,5 | 1,2 | 1,5 | 1,8 | 2,0 |
Consumo público | 1,7 | 1,2 | 1,1 | 1,1 | 1,0 | 1,0 |
Formação Bruta de Capital Fixo | 3,1 | 0,6 | 3,7 | 4,7 | 3,9 | 2,9 |
Exportações | 16,6 | 5,4 | 2,5 | 2,9 | 2,8 | 2,7 |
Importações | 11,1 | 2,8 | 2,9 | 3,4 | 3,2 | 2,8 |
Contributo da procura interna (p.p.) | 4,7 | 1,1 | 1,8 | 2,0 | 2,1 | 2,1 |
Contributo das exportações líquidas (p.p.) | 2,0 | 1,1 | -0,2 | -0,2 | -0,2 | -0,1 |
Taxa de desemprego (% pop. ativa) | 6,0 | 6,4 | 6,3 | 6,2 | 6,1 | 6,0 |
Emprego | 2,0 | 1,2 | 0,3 | 0,1 | 0,0 | 0,0 |
Cap. líq. de financiamento face ao exterior (% PIB) | -0,6 | 3,0 | 2,5 | 1,9 | 1,5 | 1,3 |
Balança de bens e serviços (% PIB) | -2,6 | 1,0 | 0,9 | 0,7 | 0,5 | 0,5 |
Deflator implícito do PIB | 4,4 | 7,1 | 2,7 | 2,2 | 2,1 | 2,0 |
IHPC | 8,1 | 5,2 | 2,8 | 2,2 | 2,0 | 2,0 |
Hiato do produto (% produto potencial) | 1,2 | 1,2 | 0,7 | 0,5 | 0,4 | 0,5 |
Fontes: Projeções CFP (2023-2027) e INE (2022).
Face ao cenário subjacente ao Relatório Perspetivas Económicas e Orçamentais (PEO) 2023-2027, de março de 2023, as atuais projeções de crescimento para a economia portuguesa em 2023 são mais favoráveis (+1,0 p.p.). Esta revisão está alicerçada, sobretudo, no desempenho robusto observado no consumo privado e exportações durante a primeira metade do ano. Por seu turno, a projeção para 2024 constitui uma revisão em baixa do valor apresentado no exercício anterior, fundamentada nas revisões em baixa no ritmo de crescimento das exportações e da FBCF, em resultado da degradação das perspetivas económicas para os principais parceiros comerciais de Portugal e da incerteza e do agravamento dos custos de financiamento da economia, respetivamente.
Para o mercado de trabalho, o presente cenário revê em alta as perspetivas para a criação de emprego em 2023 em 1,0 p.p., estimando um crescimento de 1,2%. Já a estimativa para a taxa de desemprego mantém-se inalterada em 6,4% da população ativa. Os anos seguintes encontram-se já condicionados pelas perspetivas demográficas desfavoráveis pelo que o ritmo de criação de emprego deverá aproximar-se de uma taxa nula, enquanto a taxa de desemprego deverá diminuir gradualmente até 6,0%.
Não obstante a persistência em 2023 de pressões inflacionistas relevantes, o CFP revê em baixa a sua projeção para a taxa de inflação, medida pelo ritmo de crescimento do Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC), ao longo de todo o horizonte de projeção, destacando-se as revisões mais expressivas em 2023 ( 0,7 p.p. para 5,2%) e 2024 (-0,3 p.p. para 2,8%). Esta revisão espelha o perfil descendente projetado para o preço dos bens alimentares e energéticos nos mercados internacionais. No médio prazo, antecipa-se que o ritmo de crescimento do IHPC desacelere de forma gradual até 2,0%.
Perspetivas orçamentais
A projeção orçamental assente na hipótese de não alteração das medidas de política aqui apresentada, embora favorável, encontra-se sujeita aos riscos descendentes evidenciados na projeção macroeconómica. Um abrandamento mais forte da economia traduzir-se-ia automaticamente em menos receita do que a projetada, mais despesa cíclica e na manutenção do grosso da despesa rígida, o que deterioraria o saldo projetado. Na atual conjuntura de restritividade da política monetária, a estes efeitos, usualmente designados por estabilizadores automáticos, acresce um aumento dos encargos com os juros da dívida pública. Se no passado recente, não obstante a dívida relativamente elevada, Portugal beneficiou de forma sucessiva de encargos com juros claramente decrescentes, que muito contribuíram para a redução do desequilíbrio orçamental, tal não se irá repetir no horizonte de projeção. Com efeito, em 2014, no final do período do programa de ajustamento o peso dos juros no PIB ascendia a 4,9% do PIB, em 2019 correspondia a 3% do PIB e em 2022 a 2% do PIB. Já neste horizonte de projeção (ou seja, entre 2023 e 2027) projeta-se um acréscimo deste encargo com juros em 0,5 p.p. do PIB.
Assim, considerando a evolução provável das variáveis orçamentais, na hipótese de manutenção das políticas em vigor, a atualização do cenário orçamental de médio prazo aponta para que se atinja já em 2023 um excedente orçamental de 0,9% do PIB, mais de dois terços dos quais explicados pela conjuntura económica favorável. Trata-se de uma revisão em alta do saldo orçamental projetado para este ano em 1,4 p.p. do PIB, explicada sobretudo pelo contributo da receita fiscal e contributiva (1,2 p.p. do PIB).
Refletindo esta evolução, aponta-se para que em 2023 o saldo primário, que exclui os encargos com juros, apresente uma posição de excedente semelhante ao verificado nos dois últimos anos pré-pandemia (em torno de 3% do PIB). A estabilização deste indicador ao longo do horizonte de projeção é importante para sustentar a trajetória de excedentes orçamentais até 2027, apesar da sua redução gradual traduzir o menor contributo da conjuntura (diminuição da componente cíclica do saldo orçamental) e o maior peso dos encargos com juros.
Síntese do cenário orçamental do CFP (% do PIB)
2022 INE |
Projeção CFP | |||||
2023 | 2024 | 2025 | 2026 | 2027 | ||
Receita total | 44,4 | 44,2 | 44,5 | 44,4 | 43,8 | 42,6 |
Receita fiscal e contributiva | 38,2 | 37,9 | 38,1 | 37,9 | 37,7 | 37,4 |
Receita fiscal | 25,9 | 25,6 | 25,8 | 25,7 | 25,6 | 25,4 |
Contribuições sociais | 12,4 | 12,4 | 12,4 | 12,2 | 12,1 | 12,0 |
Receita não fiscal e não contributiva | 6,1 | 6,3 | 6,3 | 6,5 | 6,1 | 5,2 |
Despesa primária | 42,8 | 41,2 | 41,4 | 41,4 | 40,9 | 39,8 |
Despesa corrente primária | 38,8 | 37,3 | 37,3 | 37,1 | 36,8 | 36,4 |
Despesa de capital | 4,0 | 3,9 | 4,1 | 4,3 | 4,2 | 3,4 |
Saldo primário | 1,6 | 3,0 | 3,0 | 2,9 | 2,8 | 2,8 |
Juros | 2,0 | 2,1 | 2,3 | 2,3 | 2,4 | 2,5 |
Despesa total | 44,8 | 43,3 | 43,7 | 43,8 | 43,4 | 42,2 |
Saldo orçamental | -0,4 | 0,9 | 0,8 | 0,6 | 0,4 | 0,3 |
Saldo ajust. medidas one-off | -0,3 | 1,1 | 0,8 | 0,6 | 0,4 | 0,3 |
Dívida pública | 113,9 | 104,7 | 100,3 | 96,5 | 93,1 | 89,4 |
Fontes: INE, 1.ª notificação de março de 2023, do Procedimento por défices excessivos, Projeções e cálculos do CFP.
Na presente projeção, o rácio da dívida deverá diminuir 24,6 p.p. nos próximos cinco anos, alcançando 89,4% do PIB em 2027. Esta trajetória será determinada pelos excedentes primários e por um efeito dinâmico favorável. Uma análise de sensibilidade agravando os custos do novo financiamento em 50 pontos base, em cada um dos anos deste período, aponta para um impacto no rácio da dívida pública no final do horizonte temporal da projeção em 0,4 p.p. do PIB. Trata-se de um impacto contido graças à maturidade relativamente longa do stock de dívida pública, que em julho de 2023 apresentava um prazo médio residual de 7,5 anos.
Riscos
Tal como nos últimos relatórios, o presente cenário macroeconómico do CFP encontra-se pautado por um enquadramento de elevada incerteza, com os riscos a penderem, maioritariamente, de forma ascendente sobre a evolução dos preços e de forma descendente sobre a atividade económica. Deste modo, o enraizamento da inflação subjacente em valores elevados, a desancoragem das expetativas de inflação de médio-prazo e o eventual recrudescimento do preço das matérias-primas energéticas poderão conduzir a uma taxa de inflação superior e mais persistente do que a atualmente projetada pelo CFP. Consequentemente, a manutenção ou mesmo intensificação do grau de restrição da política monetária poderá penalizar quer a atividade económica nacional, quer a procura externa.
Para o cenário orçamental, o principal risco encontra-se associado a esta elevada incerteza quanto às projeções macroeconómicas. Caso estas se venham a revelar menos favoráveis, tal situação levará, por efeito dos estabilizadores automáticos, a um desvio desfavorável da trajetória projetada para o saldo das AP. Para além deste, afiguram-se como riscos num sentido menos favorável do que o projetado no cenário orçamental: (i) o nível das responsabilidades contingentes existentes, onde se incluem, nomeadamente, processos judiciais em curso; (ii) pressões orçamentais quanto a prestações sociais e despesa pública com saúde, num contexto de envelhecimento estrutural da população portuguesa; (iii) impacto de eventos climáticos extremos e necessidade de medidas de mitigação e adaptação às alterações climáticas. Em sentido oposto, ou seja, que podem implicar uma trajetória mais favorável face ao antecipado, identificam-se: (i) uma maior elasticidade da receita fiscal e contributiva; (ii) um aumento mais moderado das prestações sociais e (iii) uma menor execução de investimento público financiado nacionalmente.
Tratando-se de um exercício de projeção na hipótese de políticas invariantes, que não pode em circunstância alguma ser interpretado como se de uma previsão se tratasse, acresce o risco de adoção de novas medidas de política económica ou de prolongamento de medidas que foram anunciadas como sendo delimitadas no tempo. Se tal vier a ocorrer terá implicações na evolução das variáveis orçamentais e eventualmente no próprio cenário macroeconómico.
Data da última atualização: 21/09/2023