Projeções macroeconómicas
A evolução demográfica e o crescimento da produtividade projetados para Portugal nos próximos 15 anos constituem atualmente os principais riscos macroeconómicos de longo prazo. O cenário macroeconómico do CFP apresentado neste relatório projeta um crescimento médio do PIB real de 1,2% ao ano entre 2023 e 2037. No longo prazo, e na ausência de choques, antecipa-se que a economia portuguesa deverá crescer em torno de 0,7%, o valor estimado para o seu crescimento potencial. Neste horizonte, a produtividade total dos fatores deverá permanecer como o principal motor do crescimento económico, convergindo para um contributo de 0,6 p.p., próximo da sua média histórica. O contributo do fator capital deverá permanecer relativamente estável e o contributo do fator trabalho deverá ser fortemente penalizado pela evolução demográfica, cujas projeções apontam para uma redução de 0,3% ao ano da população em idade ativa.
Riscos orçamentais
As alterações demográficas, em particular o envelhecimento da população, constituem um risco descendente para o crescimento da economia e para a sustentabilidade das finanças públicas. O envelhecimento da população afeta o crescimento económico, diretamente, via impacto no emprego, decorrente da diminuição esperada da população ativa e também através da alteração dos padrões de poupança e investimento, com impacto nas decisões de consumo e no stock de capital. De acordo com as mais recentes projeções demográficas elaboradas pelo Eurostat (EUROPOP 2023), a população total portuguesa deve continuar a diminuir e a apresentar uma alteração significativa da sua estrutura etária, o que se traduz na referida redução da população em idade ativa. Mesmo num cenário alternativo de elevada migração, a população em idade ativa irá sempre diminuir, penalizando ligeiramente a atividade económica (via mercado de trabalho). A redução esperada do contributo do emprego para o crescimento em qualquer dos cenários demográficos considerados reforça a importância da produtividade total dos fatores enquanto principal determinante do crescimento económico de longo prazo. Assim, pode concluir-se que a adoção de medidas estruturantes que possibilitem que a produtividade total dos fatores supere de forma sustentada a sua média histórica permitiria melhorar as perspetivas de crescimento e reforçar as condições de sustentabilidade a prazo das finanças públicas.
Em termos orçamentais, e tendo por base os cenários macroeconómicos desenvolvidos pelo CFP, conclui-se que o peso da receita fiscal e contributiva sobre o produto deverá crescer em todos os cenários considerados (base, de baixa migração e de elevada migração) até ao final do horizonte de projeção (2037). Este crescimento, que deverá resultar do aumento do peso da generalidade das componentes que integram a receita fiscal e contributiva (tributação direta, indireta e contribuições sociais), indica um grau de resiliência considerável deste agregado face aos diversos cenários macroeconómicos e demográficos considerados. Contudo, salientam-se como riscos de natureza descendente sobre a trajetória da receita fiscal e contributiva a erosão das bases fiscais, em função de um menor nível de remunerações resultante de um decréscimo populacional mais acentuado do que o previsto ou de um fluxo migratório assente, predominantemente, em empregos pouco especializados e com salários legalmente isentos de IRS. Adicionalmente, um maior nível de subscrição de seguros de saúde e de planos de pensões implica algum crescimento da despesa fiscal, não obstante esse comportamento individual reduzir as pressões orçamentais sobre a despesa pública.
Por outro lado, a evolução da despesa, em particular da despesa social, onde se pode incluir a despesa com prestações sociais e com cuidados de saúde, é influenciada por fatores como os ciclos económicos, a demografia, o ambiente ou as alterações tecnológicas, cujo impacto se faz sentir a médio e longo prazo. A conjugação entre as alterações da estrutura demográfica e a evolução projetada para a produtividade e o crescimento económico são determinantes para o normal funcionamento tanto dos sistemas de pensões, financiados numa ótica de repartição intergeracional, assim como para a capacidade de manutenção de um sistema de cuidados de saúde. As despesas associadas ao envelhecimento da população, em particular as referentes a pensões e saúde, colocam uma forte pressão sobre o equilíbrio orçamental. Por forma a melhor gerir estas pressões, assim como as crescentes necessidades de investimento, é necessária a implementação de um efetivo sistema de gestão da despesa pública, que hierarquize as prioridades, promova a eficiência nos gastos públicos e possibilite a criação de espaço orçamental para fazer face às crescentes necessidades de investimento em áreas como os cuidados de saúde, defesa nacional e outros riscos fortuitos e/ou condicionais.
Dentro dos riscos fortuitos, incluem-se as alterações climáticas e eventos catastróficos, que constituem também riscos orçamentais relevantes. Apesar da questão demográfica e do crescimento da produtividade representarem atualmente os principais riscos orçamentais para a economia portuguesa, as alterações climáticas também permanecem como um dos maiores riscos descendentes sobre o crescimento económico e sobre as finanças públicas, quer a nível global, quer a nível nacional. Portugal, apesar de já ter adotado diversos acordos, planos e legislação com vista à mitigação e à adaptação, tarda em implementar, articular e executar as ações e medidas propostas nestes, incluindo o estipulado na Lei de Bases do Clima. Persiste ainda a falta de clarificação das necessidades de investimento público e privado até 2050 para a efetiva concretização destes instrumentos, assim como a respetiva calendarização e fontes de financiamento. Relativamente aos riscos associados a eventos catastróficos, estes podem ser de origem humana (ataques cibernéticos e tensões geopolíticas) e de origem natural (sismos e tsunamis), sendo alguns destes não controláveis. O Relatório apresenta alguns indicadores do grau de exposição a estes riscos.
Ao nível da defesa nacional, Portugal registou uma despesa de aproximadamente 1,4% do PIB em 2022, sendo este também o valor médio registado no período desde 2014. Trata-se de um valor inferior ao definido no "Compromisso de Investimento na Defesa" assumido pelos Aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN, mais conhecida pela sigla em inglês NATO) em 2014, uma situação semelhante à verificada na maioria dos países da UE. Com efeito, de acordo com a Stockholm International Peace Research Institute (Sipri), apenas seis países da UE gastaram no mínimo 2¬¬% do seu PIB em defesa em 2022. Daqui pode decorrer uma pressão para a despesa pública, pois a afetação à Defesa Nacional, de forma sustentada, de 2% do PIB, exigiria um aumento anual desta despesa em torno dos 0,6 p.p. do PIB.
No que se refere aos riscos condicionais, destacam-se os associados a passivos contingentes, que em 2021 ascenderam a 50,4% do PIB, três quartos dos quais respeitantes a entidades financeiras controladas pelas Administrações Públicas, classificadas fora do perímetro orçamental. Excluindo os passivos destas entidades financeiras, e utilizando informação disponível relativo ao ano de 2022 observou-se uma redução generalizada das responsabilidades contingentes em rácio do PIB para níveis inferiores ao verificado no ano pré-pandemia. Destacam-se neste âmbito as garantias concedidas ao sector financeiro, concretamente a extinção das responsabilidades relativas à garantia de carteira e o decréscimo das responsabilidades relativas ao mecanismo de capitalização contingente do Novo Banco, que contribuíram para que as responsabilidades com garantias públicas se reduzissem para 4,5% do PIB. A dívida gerada por entidades públicas não financeiras classificadas fora do perímetro orçamental acompanhou esta evolução fixando-se em 3,1% do PIB em 2022, o mais baixo desde 2007, o mesmo sucedendo com as Parcerias Público-Privadas cujas responsabilidades reduziram-se de 2,2% do PIB em 2019 para 1,7% do PIB em 2022.
Análise da sustentabilidade da dívida
De acordo com a análise determinística de sustentabilidade da dívida apresentada no presente relatório, o CFP projeta que, no cenário base, o rácio da dívida pública apresente uma trajetória descendente ao longo dos próximos 15 anos, estabilizando em 87,2% do PIB em 2037. A dívida pública em percentagem do PIB apresenta, em 2023 e 2024, um ritmo de diminuição expressivo, impulsionado pela inflação e pela consolidação orçamental, que se reflete em saldos primários positivos e relativamente elevados nestes anos. Já para o período 2025-2037 antecipa-se uma redução mais gradual do rácio da dívida, fundamentalmente devido a um contributo menos favorável do saldo primário e do efeito dinâmico (ou bola de neve), este influenciado pelo efeito do crescimento nominal previsto no cenário macroeconómico. A trajetória do saldo primário é estimada recorrendo a uma função de reação orçamental. Desta forma, a resposta do saldo primário ao rácio da dívida encontra-se influenciada por um comportamento histórico em que pontuaram anos com défices primários num contexto de dívida crescente e só mais recentemente se verificaram excedentes primários. A simulação do impacto no rácio da dívida de vários choques exógenos aponta para uma sensibilidade deste rácio a choques na taxa de crescimento do PIB e no saldo primário.
O CFP apresenta ainda, pela primeira vez, uma análise estocástica da dívida, que visa complementar a projeção determinística, ao providenciar uma análise empírica da incerteza macroeconómica que envolve a trajetória simulada da dívida. Ao contrário das projeções determinísticas, o resultado das projeções estocásticas não se traduz num único cenário base, mas sim numa distribuição de possíveis cenários prospetivos para a dívida pública que resultam de choques macroeconómicos no conjunto de variáveis determinantes dessa evolução. Neste caso, o cenário base da projeção determinística situa-se abaixo da mediana das trajetórias obtidas pelo modelo estocástico, no percentil 30. Em parte, este aparente resultado pouco conservador obtido à luz do bloco determinístico, é justificado pela dimensão dos choques passados que atingiram a economia portuguesa, captados pelo modelo estocástico, que não se repetem no cenário macroeconómico subjacente à projeção determinística.
A trajetória descendente do rácio da dívida pública no cenário base evidencia que existem condições de sustentabilidade das finanças públicas portuguesas, assim os decisores políticos continuem a tomar as medidas necessárias para obter um suficiente excedente primário. Como o período após o final do programa de ajustamento em 2014 demonstra, as condições de financiamento favoráveis que se verificaram, aliadas à disciplina orçamental, criaram uma dinâmica favorável para a redução da dívida, que se reforçam mutuamente, via ganhos de credibilidade refletidos em spreads reduzidos face à dívida alemã. Uma rutura com essa opção de política económica, simulada pelo CFP num cenário extremo em que o saldo primário regressaria à respetiva média histórica desde a entrada na área do euro (-1,3% do PIB), conduziria a um perfil ascendente para o rácio da dívida a partir de 2027, situando-se acima de 110% do PIB no final do horizonte de projeção. Como se conclui neste relatório, países cujos governos optem por prosseguir uma política orçamental que descure de forma reiterada e persistente a obtenção de um saldo primário suficiente para permitir uma redução do rácio da dívida poderão enfrentar riscos consideráveis, devido, em parte, ao potencial ciclo de feedback entre a elevada dívida pública e o prémio de risco, especialmente no caso de países com saldos de dívida já relativamente elevados. De facto, apesar da trajetória descendente do endividamento, Portugal continua numa posição vulnerável devido ao ainda elevado rácio de dívida pública e privada, estando assim sujeito a que, na ausência de uma conjuntura favorável e na eventualidade de acontecimentos idiossincráticos, os custos de financiamento aumentem significativamente.
Data da última atualização: 12/12/2023